domingo, 19 de setembro de 2010

Amarindo

Amarindo acordou mais uma vez muito cedo para ir trabalhar, mas então lembrou que estava de férias. Ah, que sensação boa! Acordar cedo e não precisar trabalhar, pensou. Um dia inteiro para mim. Fazer só o que se quer, ou não fazer nada! Que bom! Amarindo gosta mesmo é de ler. Será que alguém não estaria interessado em contratá-lo só para isso? Ele ri da ideia. Levanta da cama, vai direto ao banheiro, sua atividade primeira do dia. Após a higiene, prepara o café fraco, como ele gosta, para tristeza de alguns. Mistura, no copo, duas colheres de leite em pó ao café fraco, pega um pão passa manteiga, acende uma boca do fogão e vai passando por cima o pão, até ficar queimadinho. Acrescenta uma pitada de sal e se refastela com aquele sabor sem igual. Abastecido pela manhã ele agora pode se dedicar ao que mais gosta: os livros. Um momento. Como se conta uma história de alguém que gosta tanto de livros? Ele vai passar as férias lendo? É sim. Pelo menos a maior parte do tempo. Se está achando chato, desista agora de acompanhar o Amarindo. Ele não vai se importar, porque ele se dá melhor com livros do que com pessoas. Quando enjoa de ler, ele levanta, dá uma volta pela casa, "fala" com os cachorros, depois apanha a guitarra e "faz um som". No início era guitarra muda porque não havia amplificador, porém agora ele já tem um e pode fazer barulho à vontade.
A manhã passou voando. Parada para o almoço, em seguida internet. Lê alguns e-mails, manchetes nos jornais, alguns vídeos e está pronto para voltar ao livro. Vai buscar na estante o segundo livro que está lendo. Este sobre História. Lamenta o fato de esquecer muito do que lê, mas como sua satisfação é a leitura, não se importa muito com isso. Pelo menos enquanto lê ele sabe. Depois esquece. Por isso ele não para de ler. Lê tanto que agora precisa de óculos e ficou corcunda (cuidado com a má postura!). E ainda tem o peso da guitarra, pesando de um lado. Talvez compense a corcunda, de alguma forma. A barba por fazer coça feito cachorro com pulga. A dor nas costas é agora crônica. Não quer saber de exercício, porque não gosta de suar. Ele quer agora é ser escritor, mas ainda falta talento para isso. Talvez nunca consiga escrever nada de importante, entretanto isto também não importa. Mas gostaria de ser lido por alguém algum dia e que gostassem de seus escritos. Já que não tem muitos amigos, seria amigos de outros por meio dos livros que escrevesse. Não é o que dizem? Que o livro é um grande amigo? Assim ele teria muitos amigos. Cansado de ler, levanta e vai tomar café. Gostaria de entender porque o poeta Augusto dos Anjos gostava tanto da morte e temas relacionados. Queria perguntar para ele. Já que não pode, procura ler o poeta procurando no próprio Amarindo a resposta. Alguém aí gosta de azedo? É. Sabor azedo. Alguém? Tamarindo é um fruto azedo, mas tem quem goste. Amarindo também encontrou muitos que gostaram dele. Não da maneira que ele gostaria, mas gostaram demais dele. E até alguma coisa que escreveu fez sucesso. Entre pacatos como ele, e entre gente alvoroçada que aprendeu a gostar de ler lendo Amarindo, porque Amarindo só escrevia sobre os livros que lia e como lia! Um dia encontraram o Amarindo já idoso e ele parecia um livro antigo. Todo amarelado, com manchas e amassado. Por fora uma capa dura, gasta pelo tempo, por dentro o miolo em bom estado. Azedo mas simpático o Amarindo. Forte para uma árvore velha, doce para um tamarindo. Amou rindo da vida.

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